segunda-feira, 9 de maio de 2011

Marcelo de Troi comenta BENÇA


Marcelo de Troi comenta BENÇA em seu blog GREGOS E BAIANOS: 

Kritica ´Bença´: BANDO FORMIDANDO

foto: JOÃO MILET MEIRELLES
`Ò pobres ! O vosso bando
É tremendo, é formidando !
Ele já marcha crescendo,
O vosso bando tremendo…
(…)
E de tal forma um encanto
Secreto vos veste tanto.
E de tal forma já cresce
O bando, que em vós parece,
(…)
Parece que em vós há sonho
E o vosso bando é risonho`
Litania dos Pobres, João da Cruz e Sousa (1861-1898).
Sobreposição de vozes, de sons, de fatos e de lembranças sob o rigor da plasticidade: isso é ´Bença´, espetáculo comemorativo dos 20 anos do Bando de Teatro Olodum. O diretor Márcio Meirelles evoca o poder ancestral para comemorar a entrada na vida adulta deste ´bando formidando´. Coloca em cena o respeito aos mais velhos, o reconhecimento do tempo como o grande forjador dos dramas e histórias humanas.
No espetáculo é evidente a tentativa de reconstrução dessa dramaturgia que engendra afro-brasileiros. Reconstrução que universaliza e problematiza não só a questão da Diáspora, mas a própria questão da velhice, de um país que não se preparou para as mudanças da sua pirâmide social.
Quem costura o enredo da peça é a fala de artistas, religiosos, humanistas, ícones da cultura popular: Bule-Bule, Cacau do Pandeiro, D. Denir, Ebomi Cici e Makota Valdina. Eles refletem sobre o Tempo (Chronos), falam sobre seus cotidianos, costumes, heranças, tradições. Em especial, é a fala de Valdina, do Terreiro Tanuri Jussara, espécie de conselheira das questões sócio-culturais da Bahia, que norteia o espetáculo.
Concordo com as palavras do diretor quando classifica o trabalho como Teatro Instalação. É o espetáculo mais plástico do Bando e aquele onde o talento do artista plástico Meirelles estáem ação. Seujogo de claro-escuro dá pistas da linha butô que deve aprofundar no trabalho futuro com Tadashi Endo.
´Bença´ evoca a necessidade de conhecermos nosso passado. O retrato de Mário Gusmão (1928-1996), primeiro ator negro na Escola de Teatro da Bahia, e os poemas de Jônatas Conceição da Silva, poeta e líder do movimento negro, falecido em 2009, estão presentes no espetáculo. Muitas outras imagens de atores negros baianos, grupos e experiências de artistas-atores negros também são projetadas, e nos levam a reflexão sobre o registro e história das Artes. Somos um povo sem memória, é fato. Onde estarão todas aquelas pessoas?
O Bando conduz a peça com naturalidade espantosa. Embora o conjunto me agrade, gostaria de citar a tríade de atrizes: Arlete Dias, Auristela Sá e Rejane Maia. Arrepiante o momento em que o ator Jorge Washington pede a ´bença´ a todas as casas de Candomblé da velha cidade da Baía. A belíssima coreografia criada por Zebrinha merece destaque. Leveza e simplicidade dos corpos linkadasa todos os detalhes da direção de Meirelles, com forte referência nas danças de terreiro.
Márcio é obstinado pela coerência. Declarações dadas por ele há 13 anos, ainda fazem sentido e não destoam do discurso do artista em 2011. Fruto desse rigor conceitual, não há lacunas em ´Bença`. A peça comprova, primeiro, que vivemos uma época multi e pluricultural e que o teatro precisa dar conta de dialogar com essa época; dois: de que esse discurso transformado em ação é coerente com os 20 anos do Grupo; e três: a constatação de que o Bando de Teatro Olodum é um dos mais importantes grupos teatrais do Brasil.
Makota Valdina, espécie de Ariadne nesse espetáculo, dá autenticidade a ação, comprova os saberes da mitologia afro brasileira, numa teia complexa que une vídeo, música, gestos e falas. Tudo ao mesmo tempo agora.
Esse chão de fato tem dono, e o Bando não está sozinho no palco do Teatro Vila Velha quando entra em cena, como alerta Makota Valdina em uma de suas falas. Ela tem razão. Estão com eles, Xisto Bahia, De Chocolat, Mário Gusmão, Abdias Nascimento, Grande Otelo, Sérgio Guedes, Lázaro Ramos e muitos outros vivos e mortos, anônimos ou não. Resistência histórica. Teatro de códigos, culturas e sotaques. Na Bahia, só o Bando poderia chegar aonde chegou, dando voz ao povo negro, colocando em pauta assuntos tabus. Com ´Bença´, o Bando reiventa nossa cultura, nos sensibiliza ante as duas principais mazelas contemporâneas: o esquecimento e o maltrato.
A bença, Bando!
 SERVIÇO
Concepção e encenação: Márcio Meirelles
Onde: Teatro Vila Velha
Elenco: Bando de Teatro Olodum
Quando: até 29 de maio
Horário: Sexta e sábado às 20h e domingos às 17h
Preço: R$40 e R$20 (meia)
Promoção: os 50 primeiros ingressos, de cada sessão, serão disponibilizados a R$ 15 (preço único). Até 24h antes de cada espetáculo. Instituições e escolas: compra acima de 20 ingressos preço único R$ 15
Informações: (71) 3083-4607 bando2@gmail.com
ENDEREÇO DO BLOG DE MARCELO: 
http://gregosebaianos.wordpress.com/

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