foto: João Milet Meirelles |
Bença: palco de linguagens, especificidades de palavras e gestos
Em recente conversa, MM (Márcio Meirelles) me disse que queria mais do que as histórias vinham lhe contando até então. Não abrir mão da linguagem dramática, sabendo que o teatro faz certas coisas que nenhuma outra linguagem faz, mas trazer para o palco outros suportes narrativos que pudessem agregar valores ao recado do texto dramático. Bença promove bem isso.
No palco, o Bando desfia o Tempo em pequenas cenas que trazem a típica relação dialógica entre personagens, mas também existem momentos em que o dramático se desdobra em outras formas narrativas para que a imagem e o texto gravados de sábios da cultura negra possam brilhar. Tudo para não perder o drama ao, por exemplo, silenciar seus 18 atores que vão cruzar o palco em belíssimas coreografias; ao colocá-los percussionistas; ao tornar mântrico, em suas bocas, um texto que se espalha, polifônico, em curtos delays (estratégia também utilizada na edição do som dos vídeos), enfim, tudo para que, da dinâmica, torne-se possível a convivência pacífica, no palco de um teatro, entre as linguagens. Interessante observar que mesmo as entrevistas embarcam dramaticamente. Makota Valdina, por exemplo, é precisa no timing de sua fala, olhares e risadas, provando que a vida, sem dúvida, é matéria prima da arte.
Menos presente, pois o foco da peça parece ser o texto, também a imagem fílmica dialoga com o grupo em cena. Principalmente, aquela projeção no meio do palco, no chão, onde os atores, nos limites do quadro imagético, parecem interagir, em certos momentos, em movimentos e reverências.
A estratégia de filmar a cena em curso, e projetá-la nas paredes laterais, também configura nova e essencial leitura. A imagem em baixa resolução e preto e branco transfigura o que se vê no palco em uma outra possibilidade cênica. Um branco difuso, espalhado na profundidade em 2D, envolve toda a cena projetada e, pelo menos para mim, pareceu a inauguração de uma outra realidade. Cena dobrada, espelhada... Quem sabe, o espaço depois da vida? Não o espaço da morte, mas o de uma liberdade tão pretendida. Aquela liberdade que o Tempo, por sua repetição – repetido aprendizado que faz de alguns homens e mulheres grandes sábios –, promete. A promessa de um tempo de liberdade, mas para o ser depois.
Sérgio Rivero
Salvador, 15 de maio de 2011
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