Por Arlon Souza
No começo, o silêncio. O tempo da pausa. O público, ávido por ação, repousa o olhar num elenco contemplativo. Talvez, se perguntando: “Eles não vão fazer nada?”. Na verdade, já faziam: questionavam o conceito e o ritmo do tempo. Do tempo desenfreado da vida. E nessa suposta não-ação, o Bando de Teatro Olodum investia em diversos elementos do teatro pós-dramático. Nesse caso, a experiência cênica passa a ser o foco do trabalho. Não há nela propriamente a construção de personagens, mas sim questões que identificam essas personagens num contexto social contemporâneo. E o espaço convencional do teatro dá lugar a uma instalação performática, onde o vídeo, a música e os atores criam essa atmosfera.
Em “Bença”, a dramaturgia se fragmenta em depoimentos de personalidades da cultura negra e religiosa da Bahia, no saber popular coletado em terreiros de candomblé e na lúcida fala dos mais velhos, que se potencializam pela liguagem audiovisual, no corpo e na voz dos atores. Vestidos de branco, eles sugerem neutralidade.
A musicalidade do espetáculo é contínua, fluida e se compõe pelo jogo verbal e pelo cruzamento de diversas sonoridades. Em tempo real, o grupo captura e projeta imagens, “pulveriza” sons de base eletrônica e percussiva e desenvolvem suas partituras cênicas. Se percebe um ambiente em que o timing da cena não é um sistema completamente fechado, o elenco parece ter autonomia para intervir e se expressar de acordo com códigos pré-estabelecidos com base no repertório acumulado nos dois anos de pesquisa do projeto “Respeito aos Mais Velhos”, que tem patrocínio do edital de manutenção de grupo cultural da Petrobrás. O que permitiu um intenso laboratório sobre as questões que norteiam o tema.
Valdina Pinto, Makota e educadora religiosa do terreiro Tanuri Junçara, é uma das personalidades do espetáculo
“Bença” é uma montagem teatral perturbadora, que questiona a tolerância com o indivíduo em estágio de plena maturidade, que fala, se movimenta e pensa num tempo diferente. É algo que desafia o público a refletir sobre o rico arsenal de conhecimentos de pessoas célebres e, ao mesmo tempo, simples.
Abençoado seja aquele que assistir ao Soterópolis nesta quinta-feira, às 22h, e a reprise no domingo, às 18h. Até lá.
O espetáculo continua em cartaz no Teatro Vila Velha, às sextas, sábados e domingos, 20h, até o dia 28 de novembro. Mais informações pelo telefone (71) 3083-4600.
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